Franklin Schmalz: a voz da juventude e da diversidade na Câmara Municipal de Dourados (MS)
Primeiro vereador assumidamente LGBT da cidade e o mais jovem eleito, Franklin Schmalz fala sobre os desafios, conquistas e planos para construir um mandato inclusivo e participativo, com foco em educação, direitos humanos e justiça social.
Aos 29 anos, Franklin Schmalz já construiu uma trajetória de lutas e conquistas em Dourados (MS), desde a defesa da educação pública até o ativismo pelos direitos LGBT+. Formado em Relações Internacionais e com mestrado em Sociologia, Franklin alia suas experiências acadêmicas e pessoais a um profundo engajamento político, que se iniciou ainda na juventude. Com uma história marcada por desafios, como a perda de sua mãe e a responsabilidade de criar seus irmãos, ele traz ao mandato uma visão voltada para a justiça social, os direitos humanos e o fortalecimento da participação popular. Recém-eleito como o vereador mais jovem e o primeiro assumidamente LGBT de Dourados, Franklin fala sobre os desafios enfrentados na campanha, as resistências por sua identidade e seu compromisso com uma cidade mais inclusiva e consciente. Nesta entrevista exclusiva ao jornal Pimenta Rosa, compartilha suas reflexões sobre política, representatividade e os planos para o futuro de Dourados.
Você foi o segundo vereador mais votado de Dourados, mas, ao mesmo tempo, enfrentou resistência e ataques. Como você lida com essas reações, especialmente relacionadas à sua identidade LGBT e filiação ao Partido dos Trabalhadores (PT)?
Estou muito feliz com o resultado e honrado por ter recebido o voto de 2.542 pessoas. No entanto, lamento que algumas pessoas, inclusive candidatas, não saibam conviver em uma democracia e não respeitam os outros. O mais grave é ver um colega eleito promovendo uma campanha difamatória contra mim. Isso é lamentável porque quem perde é a população. O papel principal do vereador é fiscalizar a prefeitura em nome do povo, e não a vida pessoal dos outros. Eu estou sereno diante desses ataques, pois tenho recebido muito apoio e solidariedade. Vamos buscar a responsabilização criminal dos envolvidos. Eles vão ter que me aceitar e também aceitar o PT, que é um dos maiores partidos do Brasil, com uma enorme contribuição para o desenvolvimento do país e a conquista de direitos para os trabalhadores.
Em sua fala, você menciona que não tolerará LGBTfobia ou discursos de ódio. Que ações concretas pretende tomar para combater esses tipos de agressões, tanto no ambiente político quanto no cotidiano da cidade?
A primeira ação será buscar as autoridades competentes para investigar casos de LGBTfobia e exigir da prefeitura municipal um plano de conscientização e enfrentamento para coibir essas violências. Vamos também buscar apoio do Governo do Estado e do Governo Federal para instituir políticas públicas de acolhimento de pessoas LGBT em situação de vulnerabilidade, oferecendo apoio social e psicológico. Na Câmara, não permitirei que manifestações preconceituosas passem sem consequências, como já ocorreu algumas vezes.
Ao falar sobre sua trajetória, você destaca seu envolvimento com diferentes causas, como educação, meio ambiente e direitos humanos. Quais dessas áreas terão prioridade no seu mandato e como você planeja articular essas pautas com os desafios de Dourados?
Minha plataforma de campanha é fundamentada na defesa da educação pública, dos direitos sociais e humanos, da pauta ambiental, da cultura e da mobilidade urbana. Acredito que esses temas são cruciais para o desenvolvimento de Dourados. Articular essas pautas com os desafios locais exigirá um trabalho contínuo de diálogo com a sociedade civil e outros vereadores. Também será fundamental buscar recursos estaduais e federais, por exemplo, para ampliar e reformar escolas e CEIMs, já que o vereador não constrói diretamente, mas pode viabilizar esses investimentos.
Você menciona ter orgulho do apoio de diferentes setores e grupos sociais para alcançar os 2.542 votos. Como pretende dialogar com esses diferentes grupos durante o mandato e garantir que suas demandas sejam ouvidas?
Vamos criar um Conselho de Participação Popular, composto por representantes de diversos setores, organizações e movimentos, para ouvir suas demandas. Faremos visitas aos bairros para entender as necessidades das pessoas e buscar soluções inovadoras em outras cidades, sempre dialogando com especialistas para trazer novas propostas para os velhos problemas de Dourados.
A LGBTfobia é uma realidade em muitos lugares do Brasil, inclusive no ambiente político. Como você acha que sua eleição pode contribuir para a visibilidade e os direitos da população LGBT em Dourados?
Acredito que o simples fato de estarmos 'sendo assunto' já representa um avanço, pois cria um espaço para falarmos sobre o tema. Muitas pessoas manifestam preconceito por falta de informação. Às vezes, reduzem minha identidade à minha orientação sexual, sem considerar minha trajetória e minhas outras características. A sexualidade de uma pessoa é apenas uma parte dela. Todos nós temos uma história, uma formação, uma profissão e uma família. Quero que as pessoas de Dourados saibam que existem LGBTs na cidade e que essas pessoas têm direitos. Combatendo a violência e o preconceito, melhoramos a sociedade como um todo. Eu farei o possível para levar essa conscientização adiante.
Você disse que sua vitória foi resultado de trabalho coletivo e mobilização. Pode contar um pouco mais sobre como foi essa campanha e quem foram as pessoas e grupos que te ajudaram a chegar até aqui?
Não tenho família em Dourados, nem padrinho político, e nunca ocupei cargos políticos em governos. Minha trajetória sempre foi como militante nos movimentos sociais, com um trabalho voluntário movido por convicção. Nas campanhas que disputei, sempre tivemos poucos recursos. Um dos pontos fortes dessa eleição foi a arrecadação coletiva, com mais de 100 doadores via vaquinha virtual, totalizando mais de 20 mil reais. A campanha foi feita com criatividade nas redes sociais e diálogos francos nas ruas. Essa combinação de novas práticas políticas, muito trabalho voluntário e a mobilização das pessoas foi o que nos trouxe até aqui.
Além do ativismo, como suas experiências pessoais e profissionais influenciam suas ideias e projetos para o mandato?
Fui criado em uma família trabalhadora, e minha mãe, que era mãe solteira, sempre trabalhou muito para nos sustentar. Isso me ensinou desde cedo o valor do trabalho e da responsabilidade. Em 2015, perdi minha mãe de forma inesperada e tive que assumir a responsabilidade de cuidar dos meus irmãos mais novos. Isso exigiu muito de mim, mas me fez mais forte. Na parte profissional, minha formação em Relações Internacionais e Sociologia me ajudou a compreender melhor a sociedade e as diferenças. Também trabalho com comunicação social, o que facilita meu diálogo com as pessoas, especialmente nas redes sociais.
Quais são suas propostas para garantir uma cidade mais justa e inclusiva para todos os habitantes de Dourados?
Dourados enfrenta muitos problemas, e sabemos que não serão resolvidos da noite para o dia. Como vereador, pretendo cobrar incansavelmente a resolução desses problemas, fiscalizar as ações da prefeitura e buscar parcerias no governo estadual e federal para trazer iniciativas e investimentos que melhorem a vida das pessoas.
Como vereador, você estará em uma posição de influência. Que mensagem gostaria de deixar para os jovens, especialmente os que enfrentam preconceito por sua orientação sexual ou posição política, que veem em você uma figura de inspiração?
Quero que a juventude saiba que agora temos um representante na Câmara que conhece a realidade de andar de ônibus, de bicicleta, que estudou em escola pública e sabe como é difícil conseguir uma vaga na universidade. Quero que os jovens entendam que nossa participação na política é essencial para garantir nossos direitos e melhorar nossas vidas. A política precisa de nós, e nós precisamos da política.
Para finalizar, você comentou que pretende construir um mandato 'à altura das lutas' que defende. Que legado você deseja deixar ao final de sua jornada como vereador de Dourados?
Quero despertar o interesse das pessoas pela boa política, mostrar que a Câmara é um espaço importante e não sem sentido, como muitos acreditam. Quero qualificar os debates e provocar ações que não são prioridade atualmente. Tenho disposição para trabalhar, e espero que as pessoas vejam que um vereador pode e deve trabalhar muito mais do que é comum.
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